Dentre os problemas iniciais da Filosofia da Ciência, afigura-se a noção de “unidade da ciência”. O desenvolvimento na ambiência do Círculo de Viena, conforme observado, por exemplo, nos trabalhos de Moritz Schlick, Otto Neurath e Rudolf Carnap, indicou o tom de boa parte das investigações filosóficas da primeira metade do século XX dedicadas ao tema. A asserção teórica para “unidade” diz respeito à gama de atividades técnico-científicas, desempenhada por especialistas, orientada pela orquestração dos esforços científicos em uma linguagem unificada a partir de um jargão que cubra lacunas lógicas, o uso geral de certas técnicas (quantificação, padronização etc.) e a rejeição a compromissos metafísicos. Em outras palavras, defende-se a ideia de que, no conjunto, âmbitos disciplinares diversos, tais como a física, química, astronomia e as ciências sociais, de alguma maneira, são redutíveis a uma teoria sobre como a realidade supervém de seus aspectos mais elementares, incluindo o compartilhamento de leis, conceitos, metodologias, evidências, valores e atitudes.
Diferentes enfoques da filosofia e da história das ciências contestam essa herança do positivismo lógico. A linha de pesquisa dos Science Studies, por exemplo, afirma que, na verdade, o pluralismo reforça a “desunidade da ciência”: as particularidades epistêmicas do conhecimento científico não são unívocas, a começar pela expressão “conhecimento científico”. O recurso às ontologias de cada teoria envolve a postulação de entidades e substâncias. A elaboração conceitual e os problemas da elaboração matemática das teorias científicas se relacionam às reflexões sobre o realismo das representações teóricas. É preciso investigar ambiguidades conceituais, ou mesmo inconsistências, dentro e entre as teorias. Conceitos tais como o de “método científico” não seriam capazes de responder como as condicionantes ontológicas, epistemológicas, históricas, sociopolíticas, econômicas e de outras ordens integram a produção e disseminação dos saberes de diferentes áreas disciplinares.
O Grupo Temático de Filosofia das Ciências Físicas, instituído na Anpof e coordenado pelos professores Eduardo Simões, da Universidade Federal do Tocantins, e Osvaldo Pessoa Júnior, da Universidade de São Paulo, trata desse domínio de pesquisa ainda incipiente, mas próspero no plano internacional. Dedica-se a discutir temas pertinentes a certos campos disciplinares, mais especificamente, entre filosofia, física, química, astronomia, cosmologia, geociências e metrologia, além de observar como se inter-relacionam. De modo geral, alguns dos temas filosóficos explorados tratam do escopo e dos limites do conhecimento em cada um desses campos. Além da interpretação de teorias e do significado dos seus conceitos fundamentais, apresentam questões metodológicas sobre como se adquire conhecimentos disciplinares.
A lista de questões fundamentais da Filosofia das Ciências Físicas é extensa. As questões sobre estética, ética e imagem pública dessas ciências ou da causalidade e determinismo em cada campo teórico coexistem com o problema da relação entre estrutura e propriedade, conhecimento e incerteza. As implicações tanto do papel da cultura material (padronizações métricas e instrumentos), quanto dos modelos científicos para a epistemologia são amplamente debatidas. Algumas das questões presentes no GT poderão trazer temas mais específicos de cada campo disciplinar ou serem compartilhados por, pelo menos, dois desses, tais como: a unidade e diversidade em Química; a biografia dos materiais; a Astrobiologia e Planetologia; a Cosmogênese da Terra e do Universo, na Astronomia e nas Geociências; a questão da temporalidade e da espacialidade nos fundamentos da Física e das Geociências; reducionismo e emergência dentro do debate metafísico e metodológico, principalmente na Física e na Química; percepções antropocentristas versus ecocêntricas e cosmocentristas, na Cosmologia e nas Geociências; e as implicações filosóficas da cosmologia quântica; interpretações e fundamentos da Teoria Quântica e sua compatibilidade com outras teorias físicas.
Os coordenadores do GT convidam a comunidade a participar deste grupo, aberto a colaborações e participações de pesquisadores que tenham interesse nos temas a ela pertinentes. Além do fortalecimento da linha de pesquisa, a incorporação de novas áreas, além das acima enumeradas, contribuirá para enriquecer o diálogo com especialistas que atuam nessa interseção entre a Filosofia e as Ciências.
Conheça mais sobre este GT no site da Anpof.